Kenny Broad, antropólogo ambiental da Universidade de Miami, explora há anos a complexa relação entre os seres humanos e o seu ambiente. «Muitas vezes pensamos que a natureza e a cultura são duas coisas distintas, mas acho que é inegável que elas estão intimamente ligadas e influenciam-se mutuamente.» Segundo ele, um dos principais erros da nossa época é considerar que o ser humano, como ser racional, está desconectado do mundo natural. «Na verdade, não pensamos no futuro, não somos diferentes de muitos animais que maximizam os seus lucros a curto prazo.» Kenny constata que, ao contrário das sociedades industrializadas, algumas sociedades tradicionais estão muito mais em harmonia com o seu ambiente e prestam-lhe uma atenção constante.
Miami: uma cidade em constante mudança diante dos desafios ambientais
Kenny menciona a rápida transformação de Miami, um lugar onde as pessoas vão e vêm, muitas vezes por curtos períodos. «É uma das cidades mais próximas da América Latina, da América Central e das Caraíbas. Temos um grande afluxo de pessoas originárias dessas regiões.» Desde 1968, ano em que chegou a Miami, o ambiente mudou de forma irreversível, constata ele. «Há mangais onde antes podíamos mergulhar na água e fazer snorkeling. Grande parte disso foi perdido devido ao desenvolvimento da costa.» Esse desenvolvimento, embora benéfico do ponto de vista económico, trouxe uma maior vulnerabilidade aos furacões e à subida do nível do mar, consequência direta das alterações climáticas.
O impacto das decisões de curto prazo no futuro da cidade
As escolhas de desenvolvimento de curto prazo têm, segundo Kenny Broad, graves repercussões na resiliência da cidade. «Agora vemos o quanto somos vulneráveis e que vai custar muito mais caro adaptar-nos do que se tivéssemos tomado decisões a longo prazo desde o início.» Apesar da consciência ecológica, muitos habitantes continuam a mudar-se para Miami e a comprar casas com vista para o mar, mesmo sabendo perfeitamente que a subida do nível do mar é real. Segundo ele, este fenómeno explica-se pela existência de redes de segurança, como seguros privados ou subsídios estatais, que atenuam as consequências das catástrofes naturais e, assim, incentivam um comportamento de curto prazo.
Comunidades pobres face à subida das águas e às catástrofes naturais
Outro desafio importante abordado por Kenny é o das comunidades pobres, muitas vezes as mais vulneráveis aos impactos das alterações climáticas. «As comunidades mais vulneráveis tiveram de se deslocar. Não conseguiram sobreviver à reconstrução do seu bairro, o que provocou uma verdadeira desestruturação dos bairros. Estes grupos, muitas vezes privados dos recursos necessários para se protegerem e reconstruírem após uma catástrofe, são afetados de forma desproporcional pelas inundações e outras catástrofes ambientais. Ao se afastar do bairro de origem, muitas vezes perderam o emprego devido à falta de transportes públicos, autocarros e comboios. O impacto das catástrofes nas infraestruturas e na mobilidade leva a mudanças profundas na composição da cidade e na forma como os seus habitantes se deslocam e sobrevivem.
A inovação como resposta aos desafios climáticos
Kenny Broad salienta a necessidade de uma abordagem inovadora para enfrentar os desafios ambientais. Em Miami, por exemplo, investigadores estão a testar em tempo real soluções de adaptação, nomeadamente na Universidade de Miami, onde um simulador de furacões permite testar várias infraestruturas e soluções para limitar os efeitos das tempestades. «Podemos testar diferentes estruturas, simular a elevação do nível do mar, instalar mini-mangais e mini-muros para testar diferentes cenários.» Estas experiências visam encontrar soluções viáveis para proteger as comunidades costeiras, respeitando o ambiente natural.
A arquitetura resiliente face à inevitabilidade das alterações climáticas
A arquitetura resiliente deve ir além das soluções temporárias e integrar-se a longo prazo nos projetos urbanos. O desafio consiste em integrar soluções de infraestruturas verdes e cinzentas para reforçar a resiliência das cidades. De facto, «temos de criar paisagens que sejam mais paisagens criadas pelo homem para gerir as inundações, mas também para criar um habitat e um estilo de vida único para viver na água e sobre a água».
O papel crucial da política e da comunicação
Para Kenny, a política desempenha um papel determinante na implementação destas soluções. Ele constata que, embora os representantes locais reconheçam a necessidade de agir face aos desafios das alterações climáticas, a implementação das soluções continua a ser um quebra-cabeças económico. «O custo das atividades de engenharia é elevado. A construção de uma rua, de um quilómetro de rua, pode custar milhões e milhões de dólares. » Um dos principais obstáculos continua a ser a falta de coordenação entre as diferentes jurisdições locais e federais, o que complica ainda mais a implementação de soluções adequadas à escala necessária.
Rumo a uma abordagem global para uma cidade mais resiliente
Para Kenny, as soluções só podem ser eficazes se forem implementadas de forma colaborativa, tendo em conta as realidades económicas e sociais de cada comunidade. «Temos de começar a construir comunidades mais resilientes e garantir que o que reconstruímos será sustentável e resistente.» A arquitetura e o planeamento urbano devem, assim, adaptar-se aos desafios das alterações climáticas, garantindo simultaneamente um ambiente de vida agradável e equitativo para todos os habitantes.
Uma mensagem de esperança para o futuro das nossas comunidades
Kenny mostra-se otimista face a estes desafios. «O pessimismo não tem lugar no mundo. Temos de encontrar oportunidades nos desafios.» Apesar das inúmeras dificuldades a superar, continua convencido de que existe um caminho para uma adaptação bem-sucedida, graças à vontade coletiva e à inovação contínua na conceção urbana. Para ele, o importante é «encontrar soluções sustentáveis e resilientes que beneficiem as gerações futuras».
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