Villes flottantes

Entrevista com Irasci Correa Santos Vieira, mulher aposentada

Irasci Correa Santos Vieira tem 69 anos. Nascida e criada na sua aldeia, dedicou 32 anos da sua vida ao serviço do município antes de se aposentar. Hoje, cuida dos netos e continua a viver ao ritmo da comunidade, testemunha ativa da sua evolução.

As transformações do rio

Desde a infância, Irasci observou profundas transformações na paisagem e no equilíbrio ecológico local.

Ela explica: «Há mudanças no rio, há mudanças, muitas mudanças. » Antigamente, não havia manguezais na zona; eles surgiram com o tempo, à medida que o rio foi perdendo profundidade. « Este mangueiro vem da foz do rio, por isso nasceu lá. Antes, este manguezal não existia. »

A alteração da salinidade da água é outro facto marcante. «A água ficou mais salgada do que antes.» Esta evolução teve consequências diretas no quotidiano: durante muito tempo, os habitantes recolhiam água do rio na maré alta para beber. «Levávamos a água do rio para casa e guardávamos nos nossos reservatórios para beber durante 15 dias, e tínhamos de a poupar. »

Uma mudança radical nas práticas e nos recursos

Este hábito de recolher água desapareceu há cerca de 35 anos, devido ao aumento da salinização e à diminuição da qualidade da água. «Hoje em dia, já não vale a pena, porque a água aqui é salgada, mesmo durante a estação das chuvas. » Um poço artesiano foi cavado há cerca de 30 anos, fornecendo água parcialmente utilizável para as necessidades domésticas. « É água potável, usamo-la para lavar roupa, cozinhar, mas não podemos fazer café. »

Hoje, a água potável provém de cisternas, que se tornaram essenciais.

A descida do nível do rio também provocou uma queda drástica da biodiversidade aquática. Antigamente, havia muitos peixes, acessíveis a partir das margens. «Havia muitos peixes aqui, em qualquer parte do rio. […] Este rio era profundo.» Hoje, essa abundância pertence ao passado.

Uma preocupação com o futuro

Perante estas transformações, Irasci expressa uma grande preocupação com as gerações futuras. «Sei o que vivi, sei o que vivo, mas penso nos meus filhos, nos meus netos.» Ela constata a escassez de peixe e a ausência de ações por parte das autoridades: «Poderíamos esperar que os nossos governos fizessem alguma coisa, mas ninguém faz nada. »

Se alguns habitantes deixaram a comunidade, nem sempre foi por causa da degradação ambiental, mas sim na esperança de uma melhor qualidade de vida na cidade.

A memória de um território em mudança

Na continuação do seu testemunho, Irasci evoca mudanças geomorfológicas específicas do rio. Ela lembra-se de uma época em que o leito do rio era sinuoso e profundo, e as embarcações seguiam as suas curvas naturais. Mas, sob a pressão dos pescadores e das embarcações leves, essas curvas foram progressivamente «cortadas» para ganhar tempo. Resultado: o curso do rio foi alterado, as margens fragilizadas e a profundidade diminuiu.

Antigamente, observava-se uma fauna aquática abundante: «Havia peixes grandes e muitos botos. […] Quando havia muitos peixes, peixes-esponja, peixes grandes, os botos apareciam.» Hoje, essas espécies praticamente desapareceram.

Pragas em aumento, predadores discretos

Ao longo dos anos, outra mudança é perceptível: a evolução das espécies presentes no ambiente imediato. Se os jacarés são agora raros — «Os crocodilos só se vêem no rio. Não há crocodilos aqui para nós agora.» —, em contrapartida, os insetos proliferam.

Em particular, o «maruim», um mosquito minúsculo quase invisível, tornou-se omnipresente: «Há tantos que, se sair daqui às 5 da manhã, não consegue ficar lá fora. […] A picada dói mais do que a de um tábua. » Estes insetos proliferam em zonas estagnadas onde a água salgada sobe e deposita folhas em decomposição.

O recuo do mar, o avanço do mangal

O mangal, outrora ausente, avança a cada ano. Irasci explica isso pela subida das águas e pela intrusão salina: «O mar entra cada vez mais pela foz do rio […] e, cada vez que chega, mata a vegetação.» Esta perturbação ecológica transforma profundamente as paisagens: «Até brinco que, no futuro, os pescadores vão tornar-se apanhadores de caranguejos!»

Aparições incomuns de animais

Irasci também conta a surpreendente descoberta de um animal marinho de grande porte, parecido com uma foca, que encalhou na região. Ela alertou os ecologistas locais para tentar salvá-lo: «Eu o encontrei. Então liguei para os ecologistas de Arari. »

Adaptações locais: apicultura e piscicultura

Face à escassez de peixes e à crescente salinização da água, os habitantes estão a desenvolver novas estratégias. A apicultura, por exemplo, implantou-se em algumas famílias: «Há criação de abelhas. […] Mas já faz um ano que não tenho mel, porque não há flores.»

A piscicultura também está em expansão, apesar das dificuldades relacionadas à água: «Os peixes que criamos aqui são o pacu-manteiga, a tilápia, o curimatã e o tambatinga. Mas a água utilizada é exclusivamente água da chuva: «Porque a água do rio é salgada, não há como utilizá-la.»

Um peixe não nativo, o piramutaba, também colonizou a área recentemente: «Não é um peixe de água doce, mas chegou aqui graças a Deus. […] Vê-se muitos agora.» No entanto, ele divide opiniões: sua carne é considerada pouco saborosa por parte da população.

Um dia a dia reorganizado em torno da escassez

A preparação das refeições depende exclusivamente da água da chuva recolhida. «As refeições que fazemos são exclusivamente com água da chuva. […] É uma dádiva do céu.»


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